BLOG DR. AMIGO – ENTREVISTA GLAUCIANE CAVALCANTE – SETEMBRO AMARELO

Instituída de 2014 pela Associação Brasileira de Psiquiatria em parceria com o Conselho Federal de Medicina, e também em alusão ao Dia Mundial de Prevensão ao Suicídio (10 de setembro), o “Setembro Amarelo” é uma campanha promovida com o objetivo de conscientizar a todos sobre a importância de se cuidar da saúde mental durante todo os dias do ano, combater os preconceitos, tabus e estigmas em torno do tema, além de acolher as pessoas que hoje, estejam passando por momentos difíceis ou de crise, para que busquem ajuda e entendam que a vida será sempre a melhor escolha.

Sobre este tema, nós convidamos para uma conversa, a psicóloga Glauciane Cavalcante (CRP 10/06539).

O suicídio (ou a tentativa dele) está ligado necessariamente a algum problema psicológico?

Glauciane Cavalcante – Sim! Porém, precisamos desmistificar quais problemas podem levar uma pessoa a cometer o suicídio. Não conseguimos falar do suicídio em sua especificidade, e sim somente da “Ideação Suicida”. Pois o suicídio perpassa por três momentos:

– A Ideação Suicida, penso sobre a ideia.

– O Planejamento, formato a ideia ou organizo.

 – O Comportamento, ou seja, a passagem do ato, o suicídio sendo consumado.

Pesquisas mostram, que 90% dos casos ocorrem em pessoas que se encontravam sob um quadro depressivo, melancólico ou por algum outro tipo de transtorno psicológico, que o indivíduo esteja vivenciando, assim como algum trauma específico.

Qual a importância de se haver uma campanha como o “Setembro Amarelo”? Precisamos de mais iniciativas como essa?

Glauciane Cavalcante – Em suma, o suicídio precisa deixar de ser um tabu. Pois, mesmo com toda a tecnologia e informação a disposição para alguns, existe o silenciamento sobre o assunto e, tal silêncio é o agravamento da doença, a fala é a libertação. A intensificação para promover a fala, luta e prevenção contra a “Ideação Suicida”, se faz necessária. Vale ressaltar que, esta intensificação não consiste somente no mês de setembro, todos os dias, a cada minuto alguém acomete o suicídio. Incentivos como estes, bem como ações e estratégias em escolas, Centros de Atenção Psicossocial (Caps), ou todo e qualquer meio de comunicação, podem interferir diretamente e de forma positiva na vida de alguém que neste momento encontra-se em sofrimento.

O que pode levar uma pessoa a tentar suicídio?

Glauciane Cavalcante – Como citado anteriormente, a ideação suicida ou o suicídio em sim. Não é uma escolha e sim um sintoma, logo é um sinal. Vários fatores, podem levar o indivíduo para Ideação e ao planejamento. Porém, após o ato consumado, jamais teremos respostas, o ato consumado e concretizado é o fim. Todo “ato”, é o impulso, quem está em sofrimento e chega ao “ato”, possui uma rigidez cristalizada, sem conseguir falar sobre a dor. Tal dor/sofrimento, perpassa por um processo denominado de “Os 3 Is de dor”.

“Intolerável”: quando não suporta mais; “Inescapável”: se sente sem saída; “Interminável”: estou sem fim.

O ato consumado do suicídio, é a eliminação da dor, ocorrendo neste momento o desespero, desamparo e a desesperança.

Existem sinais ou indicativos de que uma pessoa possa estar caminhando ao suicídio?

Glauciane Cavalcante – Atualmente na contemporaneidade, desafios como a invisibilidade da dor, e dos sentimentos dos quais sentimos, são burlados a todo momento. A vida frenética, associada com a falta de tempo para promover uma rotina saudável, possibilitam a falta de se auto perceber, bem como reforçar certa invisibilidade. Toda dor possui um começo e cada ser humano sente de uma forma específica, como por exemplo, a apatia, desânimo e desinteresse nas relações interpessoais. Com adolescentes, pode ocorrer uma queda no rendimento escolar, fobias e dentro deste último o TOC (Transtorno obsessivo compulsivo), levando o adolescente para um processo de automutilação, dentre outros. O mais importante é praticarmos a percepção, termos a sensibilidade em perceber o meio do qual estamos inseridos, como nossa família, amigos, local de trabalho etc. Alguém ao nosso lado, pode estar em sofrimento e precisando de ajuda.

Muitas pessoas não entendem que isso é fruto de um processo amplo e por vezes, bem longo, mas é preciso esclarecer, desmitificar, acabar com preconceitos e ajudar mais pessoas?

Glauciane Cavalcante – O suicídio é o triunfo da desesperança, logo acreditar é a esperança. Para conseguirmos desmistificar o assunto, precisamos falar da dor, todavia a comunicação é a nossa maior aliada, quanto mais informação, mais possibilidades teremos.

E como pode ser feito o acompanhamento por parte de profissionais especializados? A terapia é uma ferramenta fundamental?

Glauciane Cavalcante – A psicoterapia é um processo de autoconhecimento, onde o indivíduo é convidado em seu caminhar a construir ferramentas e subsídios, capazes de promover o enfrentamento de sua própria dor. É de extrema importância a busca por um profissional Psicólogo capacitado, para que o mesmo possa auxiliar na promoção deste caminhar durante o processo psicológico. Para, além da psicoterapia, existem grupos de apoio, Caps ou até mesmo, para quem não consegue força para buscar ajuda, por vergonha ou medo, existe o CVV (Centro de Valorização a Vida), com apenas uma ligação gratuita pelo fone 188, alguém irá lhe escutar no seu momento de dor e desespero. Vale ressaltar, que o CVV é apenas para uma emergência, o indicado é o acesso a psicoterapia com um profissional psicólogo.

O apoio de pessoas mais próximas (família e amigos), é fundamental para um processo de recuperação?

Glauciane Cavalcante – A rede de apoio é fundamental para quem encontra-se em sofrimento. O acolhimento de familiares, amigos dentre outros, é a forma mais genuína de demonstrarmos o amor. A pessoa que está passando por um processo de suicídio, está totalmente desacreditada da vida, a dor a consome, se faz necessário todo o acolhimento, afeto e sensibilidade da rede de apoio para promover o acreditar novamente, levando em consideração com a ajuda do profissional psicólogo caminhando de mãos dada no processo.

Se fala muito em casos assim envolvendo jovens e adultos, há casos envolvendo crianças?

Glauciane Cavalcante – Segundo, a OMS (Organização Mundial da saúde), anualmente, mais de 700 mil pessoas cometem suicídio. Todavia, existe uma baixa incidência do suicídio em crianças. Pois a criança, possui uma imaturidade cognitiva, para elaborar o planejamento suicida, bem como a dificuldade em métodos letais que possam auxiliar ao ato consumado. Entretanto, não devemos desconsiderar a possibilidade de uma criança acometer suicídio, tudo dependerá do quadro e estado de adoecimento em que a criança se encontra.

Por si só, a pandemia que ainda vivemos hoje, com os isolamentos, as incertezas, a retomada das interações sociais e a crescente ansiedade vivida por grande parte da população mundial (também provocada por muitos outros fatores além da pandemia), podem servir de gatilhos para atitudes ou pensamentos suicidas?

Glauciane Cavalcante – A pandemia clinicamente falando, foi consideravelmente um gatilho para promover transtornos psicológicos. Quem, antes da pandemia, já estava enfrentando algum tipo de problema agravou-se e, grande parte da sociedade, diante do cenário de isolamento, mortes e incertezas adoeceu. Conflitos internos foram ativados, e quem não estava com sua estrutura emocional sendo trabalhada e cuidada em terapia, entrelaçou-se sobre a dor existencial e muitos atentaram contra sua própria vida. É importante ressaltar, que em alguns casos, a pandemia foi um susto, porém serviu como um despertador para a dor a ser enfrentada e cuidada em prol da saúde existencial.

Sobre este tema tão sensível, que mensagem você pode dar para quem está lendo sua entrevista agora?

Glauciane Cavalcante – O amor, é a maior âncora que o ser humano possui. Quando temos o que amar e a quem amar, é acreditar que vamos conseguir viver mais um dia. Se há vida, têm jeito, ao se acolher, você também se escolhe. Aprenda a se dar colo, a se cuidar e principalmente a se perdoar, faça com você, o que um dia você já fez para alguém. Construa esse laço.

E nós da Dr. Amigo sempre lembramos, cuide da sua saúde física e mental. Siga os conselhos e orientações da Dra. Glauciane Cavalcante, se precisar procure ajuda de um profissional. Você não está só.

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Olá amigo, posso ajudar?